(À T., que descobriu que há muitos autocarros que não param onde queremos)
Muito pequena, não sei bem que idade tinha, mas os olhos ainda se abriam de surpresa em surpresa e brilhavam com o riso. Lembro-me dele, mas não me lembro do seu nome. Perdi-o.
Era da minha altura pois os seus olhos batiam nos meus, rodeados de uns caracóis que me faziam cócegas no nariz. Passávamos dias inteiros a correr à procura de aventuras, a caçar borboletas, a borrifar as horas com o leite em pó com que enchíamos a boca.
Lembro-me de fugirmos dos outros, na nossa brincadeira preferida, e de nos escondermos no armário do Tio Artur, uma arca gigante que navegava ao nosso desejo. Aí, muito escondidos, descobríamos partes um do outro. Mostrava a barriga em troca de um beijo na cara. O amor começou assim para mim, em trocas comerciais em que um não podia dar sem receber. Os nossos corpos foram-se revelando por entre uma fuga ao jogo das escondidas e o armário do Tio Artur.
Um dia, a aventura comercial cruzou-se com um carrinho verde, opulento. E o meu primeiro amor trocou-me por um objecto absurdo, que se deixava empurrar sem um pouco de vontade própria, submisso, numa ausência total de imaginação.
Não me lembro se chorei, mas o nome dele, não o perdi. Deitei-o fora!
quarta-feira, 9 de dezembro de 2009
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